Cingapura recicla e reúsa 30% da água consumida

Compartilhe esse conteúdo

Com vontade política e ferramentas de última geração, cidade-estado asiática encontra saída para escassez de recursos hídricos

Enquanto o governo paulista, contrariamente à opinião de especialistas, insiste na afirmação de que não precisa racionar a água consumida na região metropolitana de São Paulo, embora 23% da reserva profunda (volume morto) do sistema Cantareira já tenha sido bombeada, Cingapura, uma cidade-estado com superfície de 710,2 km² e população de 5,4 milhões de habitantes, está resolvendo esse problema de uma forma bastante criativa. Trata-se de uma localidade que tem as limitações de um território minúsculo, escassos cursos d’água e a necessidade de importar o produto da vizinha Malásia.
 

Embora exista a barreira cultural de se consumir água reciclada, a chamada NEWater é misturada à água natural nos reservatórios nas épocas de seca para consumo doméstico em Cingapura. Ao longo desse processo, ela foi testada cientificamente e aprovada quanto a sua potabilidade por um comitê de especialistas independentes, inclusive do exterior. E passou com louvor em uma longa série de exames de laboratório que totalizou 110 mil testes científicos. A NEWater é a parte mais visível dos programas de produção, preservação, redução de consumo e reciclagem de água conduzidos pela Public Utilities Board (PUB), a agência governamental que trata do problema.

Não só o sucesso da PUB é reconhecido fora do país, como a gestão de recursos hídricos passou a ser uma tecnologia de exportação para outras cidades do exterior. Em cinco décadas, Cingapura saiu de uma situação de escassez crônica para abastecimento pleno, a despeito de poucos recursos hídricos próprios e a poluição de seus rios.

A PUB se vale de quatro fontes de água: captação local, água importada, água reciclada altamente purificada (batizada de NEWater) e dessalinização de água do mar. Cingapura tem sistemas separados para captar água de chuva e água usada. A primeira é coletada através de uma vasta rede de canais, rios, reservatórios de água de chuva e tratada para torná-la potável. É uma das poucas cidades do mundo que pratica isso em larga escala.

Desde 2011, dois terços do território físico local passou a funcionar para coleta, com a conclusão dos reservatórios de Marina, Punggol e Serangoon. Com a maior parte dos rios já barrados, foi necessário captar água de pequenos cursos próximos ao litoral e usar a tecnologia para depurar graus variados de salinidade para torná-la potável. da Malásia, segundo um acordo que vai expirar em 2061. A NEWater é o símbolo do sucesso da política de reúso de água no país, pois ela é tratada em alto grau, purificada em seguida com ultrafiltragem de membrana e desinfetada com raios UV, tornando-se própria para consumo humano. As quatro plantas de NEWater podem suprir 30% da demanda de água potável — percentagem que deve se elevar para 55% por volta de 2060.

A quarta fonte é água dessalinizada por osmose reversa: a primeira planta produz 136 mil m³/dia, e a segunda planta, de 318 mil m³/dia, foi comissionada em 2013 — o que corresponde a 25% da demanda. Outros projetos de abastecimento e saneamento prosseguem, como a limpeza do rio Cingapura, a barragem Marina, já pronta, e a construção do sistema Túnel Profundo de Esgoto.

Um lago dentro da cidade

A barragem no estuário do Canal de Marina criou um lago, de águas limpas e cristalinas,  que também é o 15º reservatório de água do país, que atrai milhões de visitantes adeptos dos esportes aquáticos e da vela. O lago ainda serve de barreira contra as marés e inundações das partes baixas da cidade.

O Sistema do Túnel Profundo de Esgoto é um túnel de 48 km que traz a água usada, das partes norte e leste de Cingapura, para tratamento na planta de reciclagem Changi, antes de seguir para purificação adicional e ser fornecida como NEWater para consumo industrial e doméstico. A segunda fase desse sistema está em projeto, com o Túnel Sul, associado com rede de coletores de esgoto, uma segunda planta de reciclagem, instalação de purificação NEWater e emissário submarino para descarte no oceano. Visa a atender a parte oeste da cidade, inclusive o centro e os novos desenvolvimentos urbanos, como a Tengah New Town — previsto para operar em 2022.

Mobilização do público

A agência PUB conduz programas sistemáticos para engajar a população na preservação dos recursos hídricos. Um deles almeja transformar Cingapura numa cidade de jardins e lagos, com a reurbanização de cerca de 100 localidades, criando parques sempre perto de fontes de água, a fim de que a população possa valorizar e aproveitar os recursos hídricos disponíveis. Cerca de 20 projetos já foram concluídos, e o restante deverá ser implementado até 2030.

Há diversos programas que estimulam a economia no consumo, como o que estabelece uma meta diária de 10% para as indústrias e de 10 litros/dia para as residências. O objetivo é reduzir o consumo per capita dos atuais 152 litros para 147 litros no ano 2020.

A tecnologia que tornou a NEWater possível

A água reciclada e altamente purificada — e potável — é usada principalmente para fins industriais e resfriamento do ar condicionado em edifícios comerciais. A NEWater é empregada também na fabricação de wafer de silício na indústria eletrônica, que exige um padrão de pureza inclusive superior à água potável. Uma rede dedicada e exclusiva abastece os clientes industriais.

Nas épocas de seca, entretanto, a NEWater é misturada à água natural nos reservatórios que, após tratamento adicional, é suprida aos consumidores pela rede doméstica existente. Duas vezes por ano, essa água reciclada é submetida a auditoria externa formada por especialistas internacionais em química, toxicologia, microbiologia e engenharia, apresentando resultados acima dos padrões da Organização Mundial de Saúde.

O processo de purificação da água usada começa pela microfiltragem, em que membranas retêm sólidos suspensos, partículas coloidais, baterias, alguns tipos de vírus e protozoários. Essa água filtrada resultante contém apenas sais dissolvidos e moléculas orgânicas.

A segunda etapa é de osmose reversa, em que a membrana semipermeável deixa passar apenas as moléculas de água. Contaminantes indesejáveis, como bactérias, vírus, metais pesados, nitratos, cloretos, sulfatos, subprodutos de desinfecção, hidrocarbonos aromáticos, pesticidas etc., ficam retidos na membrana. A água resultante contém quantidade desprezível de sais e matéria orgânica.

O terceiro estágio é um back up de segurança, aplicando raios UV para esterilizar qualquer organismo vivo. Alguns produtos químicos alcalinos são adicionados para restaurar o equilíbro de pH da NEWater, antes de ser bombeada para uso industrial ou doméstico. A osmose reversa também é empregada para dessalinizar a água do mar para consumo humano e para reciclar a água usada nas naves espaciais.

El Niño está para chegar com mais inundações e seca

Esse fenômeno climático já preocupa os principais centros meteorológicos, prometendo trazer inundações mais severas para algumas regiões da América Latina, contrapondo-se às secas igualmente causticantes em outras. Enquanto vastas populações enfrentarão chuvas torrenciais e água pelo pescoço, outras sofrerão meses a fio de falta de água, que vai trazer enormes prejuízos à agricultura e pecuária, com o aumento da temperatura.

O El Niño também vai apontar claramente os poucos governantes que fizeram obras preventivas nos anos recentes, desde a última aparição do “menino”, e os do tipo “cigarra”, cujas populações ficarão à mercê das violentas inundações ou secas.

O nome El Niño foi dado pelos pescadores peruanos há um século, porque o fenômeno climático atinge o ápice e fica evidente por volta do Natal.

Em um período de dois a sete anos, causas naturais levam a água morna do Pacífico ocidental a se deslocar no sentido leste para a costa da América do Sul. Isso provoca chuvas torrenciais acompanhadas de inundações no Equador, na costa desértica do Peru e na parte oeste da Bolívia, e seca severa nos altiplanos andinos desses países.

Pesquisas científicas acumulam provas que atestam que o El Niño interfere nos padrões climáticos normais em diversas regiões do globo, como seca e incêndios florestais na Austrália setentrional, Indonésia e Malásia. Pode diminuir as monções e os furacões no Caribe, agravar as chuvas na Califórnia e sul do Brasil e piorar a seca em outras partes do território americano e norte do Brasil.

O próximo El Niño pode ser extremo, avisam especialistas — e a última vez que ocorreu com intensidade foi em 1997-1998. Há institutos de meteorologia que estimam uma probabilidade de 80% para uma ocorrência severa do El Niño no ano que vem, enquanto outras apostam em um fenômeno moderado.

Em 1983, quando ocorreu o El Niño severo, a ONU estimou que a perda total em moradia, infraestrutura e produção chegou ao equivalente a 13% do PIB na Bolívia, 9% no Peru e 5% no Equador, com prejuízos similares no Brasil e América Central. O El Niño de 1997-1998, com temperaturas mais altas do que em 1983, provocou danos na mesma escala.

O Banco Mundial estima que os danos crescentes provocados por desastres naturais na América Latina podem ter atingido US$ 50 bilhões no período 2001-2010. Os governos da região já se movimentam para o próximo El Niño. O Equador já providenciou uma linha de crédito de US$ 1 bilhão, enquanto que Peru fez uma provisão no orçamento de mesmo valor, para obras de reforço em pontes, estradas e diques em áreas sujeitas a inundações.

Um alerta tardio para quem assumir o Governo Federal e as administrações estaduais no País em janeiro de 2015, porque é a gestão atual — inclusive nas prefeituras – que deveria ter providenciado as obras preventivas enquanto El Niño não vem.

Sistema manual de tratamento de água

Um sistema manual e portátil de tratamento e purificação de água, lançado na última edição da IFAT — maior feira do mundo de gestão de água, esgoto, lixo e materiais, realizada na Alemanha, em junho -, foi uma das principais novidades apresentadas neste evento. Em tempo de busca de soluções práticas para reúso de água, a Villagepump, da empresa alemã Bioworks, se mostra bastante eficiente.

Uma unidade de Villagepump é capaz de prover até 700 litros/h de água potável, eliminando principalmente agentes patogênicos que causam a diarreia, disenteria, cólera e hepatite. A unidade opera extraindo água de poços, charcos, tanques, reservatórios, lagos e cursos de água.

O equipamento funciona de forma manual, através de bombeamento, e pesa 67 kg. Ele é compacto, tem 1,7 m de altura, 50 cm de largura e 59 cm de comprimento.

A tecnologia do equipamento inclui três estágios de filtragem: um remove partículas maiores de 50 mícrons; uma outra filtragem elimina bactérias, vírus, protozoários e cistos por meio de membranas, que permitem, por outro lado, a passagem de minerais; e, por último, um filtro de carbono remove odores. O processo todo leva de 5 a 8 minutos.

A  tecnologia de filtragem de água para purificação é relativamente antiga, mas a vantagem do Villagepump é o seu modelo compacto, fácil de transportar, e também a sua ope
ração, que não depende de energia elétrica nem combustível.

Fonte: Revista O Empreiteiro


Compartilhe esse conteúdo

Deixe um comentário