Espaço público e patrimônio

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"A relação com o espaço público é isso: uma cidade precisa ser bonita! Nós estamos vendo aí uma série de obras públicas que são feias e grosseiras. Não é questão de dinheiro, com o dinheiro que se tem, ou menos, pode-se fazer melhor", diz o arquiteto Alfredo Britto. "Um dos exemplos que gosto de citar neste caso que é uma coisa lamentável – é a cidade do samba. A cidade do samba era a oportunidade de fazer uma obra que só o Rio de Janeiro pode ter, não dá pra fazer a cidade do samba em Amsterdan ou Viena. Era para ser uma obra exemplar, era para ser uma obra para o turista descer no Rio de Janeiro e dizer ‘eu quero conhecer a cidade do samba’ . Mas é uma coisa grosseira como concepção, como execução, como tudo. É nestas horas que se perde a oportunidade de tornar a cidade melhor. Nós queremos que daqui há 50 anos, esta política de fazer qualquer coisa mude para fazer o melhor que se pode fazer".
A cidade começa a receber obras que serão um patrimônio importante daqui a cinquenta anos. O Museu do Amanhã, o Museu da Imagem e do Som, Parque Bossa Nova, no Leblon, o Porto Maravilha,o Parque Olímpico e outras que serão em breve marcos da cidade. Além disso, as que existem estão com a promessa de que serão mantidas e preservadas. Mas o Rio de Janeiro, por enquanto, é um canteiro de obras a céu aberto.
Em entrevista recente o subsecretário de Patrimônio Cultural da Prefeitura do Rio, Washington Fajardo, disse que a designação da ‘Cidade Maravilhosa’ para ser a sede destes eventos esportivos desencadeou uma ‘euforia da construção’ que representa uma ‘ameaça’ ao acervo histórico, explicou. Fajardo reconhece: "Há um certo descontrole no processo de construção", mas citou um decreto do dia 5 de abril deste ano no qual o prefeito Eduardo Paes estabelece a revisão de novos projetos para que não afetem a paisagem da cidade.
Mais um entrave para a conservação do Centro Histórico do Rio é a falta de segurança.Além de descasos como o que se vê no Museu Histórico da Cidade, onde as infiltrações são aparentes ou em construções antigas e danificadas como a sede do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
A Prefeitura prometeu investir somas milionárias para revitalizar os espaços públicos, em um plano relacionado também à recente candidatura do Rio de Janeiro para tornar-se Patrimônio Mundial da Unesco na categoria paisagem cultural. Mas ainda não apresentou detalhes desses planos.
Segundo Britto, a situação não será desesperadora em 50 anos, mas isso depende do carioca. "A sociedade evoluiu muito neste sentido. Temos uma população que está voltando a preservar seus valores, não só os valores naturais, a mata, árvores, montanhas, lagoas, como o patrimônio cultural edificado. Hoje não se derruba impunemente um prédio de patrimônio público como se fazia há 20 anos. As pessoas sabem que certas obras como, por exemplo, o mosteiro de Santo Antônio ou o Mosteiro de São Bento, que chegaram no século XVIII e XVII e ainda estão aí, vão continuar daqui há 50 anos. Neste ponto o patrimônio só vai se enriquecer, não será perdido. Principalmente porque hoje a mentalidade é de mudança, de transformação para melhor. Até pouco tempo preservar significava na mentalidade dominante desta sociedade criar um obstáculo ao progresso. Pensava-se no patrimônio como velharia. Hoje não se derruba um patrimônio arquitetônico para colocar um edifício, porque há uma resistência, uma reação e isso só vai aumentar porque atualmente se percebe que o patrimônio tem valor, ele agrega valor ao investimento". Britto comenta: "O Bairro de Santa Tereza correu o risco de desaparecer há 40 anos e hoje isso seria impossível".
A preservação de patrimônio se intensifica no mundo inteiro. Investidores procuram prédios tombados para colocarem determinado investimento, apostando que ali terão um retorno melhor pelo apelo institucional, mas parte da população do Rio de Janeiro ainda olha com preconceito e descaso alguns pontos de preservação da própria cidade.
Atualmente parte do subúrbio carioca está sendo preservado e outra não. Nas ultimas administrações e nas atuais há uma certa percepção com relação à necessidade de reestruturar melhor o Rio. Estão sendo feitos investimentos na zona norte e na zona oeste. Obras importantes estão sendo realizadas em várias destas áreas, tais como o Túnel da Grota Funda que vai mudar completamente a ligação da cidade com Sepetiba. Outras ligações estão sendo feitas com uma articulação nova e contando com que a relação governo e áreas menos expostas possam ser mudadas, principalmente com o enfoque das Olimpíadas.
A percepção geral é que em cinquenta anos o Rio de Janeiro estará mais integrado e estruturado como cidade. Mas o problema é sempre o mesmo. Os investimentos a serem feitos terão que mudar de parâmetro. A construção de uma via de BRT por exemplo, é um tipo de obra que não deve ser pensada como uma canaleta do ônibus. Ela é responsável por todo impacto que acontece na área, então é necessário tratar do entorno e qualificar essas áreas para produzir dignidade.
Alfredo Britto esclarece: "Há dinheiro para isso, há dinheiro para o trem bala e dinheiro para fazer a malha ferroviária do Rio, uma coisa não vai em detrimento da outra. Então quando se pensar no futuro tem-se que cuidar disso tudo e essa é uma questão que me preocupa, que não tenham esse olhar. A cidade vem sendo olhada com uma visão do século XX, econômica, custa tanto e vale tanto – o raciocínio da sociedade que foi levada a isso é vinculado a uma questão de números mas não de custo- benefício. Pode-se botar 20 bilhões numa obra, mas se tivermos um resultado que traga um benefício para a sociedade em geral, os 20 bilhões são para isso e estão bem empregados. O que não pode é botar 1 bilhão em uma obra que afinal só destrua o que tem valor. Esse é o problema".
O Rio é uma cidade peculiar, única e extraordinária que convive com realidade da pobreza como todo o Brasil, mas esta cidade já foi chamada de maravilhosa e poderia voltar a ser.
"Não pode fazer obra feia no Rio, não pode estragar a cidade. Isso é um princípio, não se pode fazer coisas que sejam indignas para o carioca e esta atitude tem de ser predominante nos dirigentes, nos construtores, nos empreiteiros. É preciso ter respeito pelo espaço público", conclui Britto.

Polo de inteligência
Antônio Carlos Dias, da Agência Rio Negócios se orgulha em mostrar que, paralelamente às Olimpíadas, outros fatores es

tão mobilizando a cidade para um futuro promissor: "A descoberta do Pré-Sal e os investimentos em Óleo e Gás – onde o Brasil vai receber 378 bilhões em investimentos de 2011 a 2014. Parte significativa virá para o Rio de Janeiro", diz o diretor comercial.
Há então uma demanda por novas tecnologias e inteligência. A partir disso, diversas empresas estão abrindo centros de pesquisas no Rio de Janeiro. "Mais de uma dezena de multinacionais estão se estabelecendo no Fundão (prédios da Universidade Federal do Rio de Janeiro), para realizar pesquisas em conjunto com a academia local, num investimento em torno de US$ 600 milhões, dos quais US$ 450 milhões vão diretamente para o Centro de Pesquisa e Tecnologia" segundo Antônio Carlos Dias.
Inaugurado em 2003, o Parque Tecnológico da UFRJ é hoje referência de excelência no mundo acadêmico e empresarial. As dezenas de empresas, de incubadoras até grandes, localizadas na área (que ocupa 8% de toda a superfície da Ilha do Fundão, no Rio de Janeiro) lançam talentos e novos produtos a todo momento no mercado e já são responsáveis por milhares de empregos.
Desde 2007, o Centro de Pesquisa da Petrobras ocupa quatro prédios do Parque e outros grandes grupos do setor de energia estão se instalando. Uma nova infraestrutura começa a aparecer ligada aos jogos olímpicos, em uma parceria município/governo, com a construção de um novo aterro sanitário motivado pelos jogos.
Segundo a Agência Rio Negócios, o Parque Tecnológico da UFRJ já é considerado o quarto maior do mundo em extensão e tem instaladas em seu espaço importantes empresas estrangeiras como a FMC Technology, a Baker Hughes, a Schumberger e a Halliburton. Outra gigante que está construindo o seu centro de pesquisa na área é a General Eletric.
Dados divulgados pelo diretor-executivo do Parque Tecnológico, Maurício Guedes, dão conta que até 2014, o local deverá abrigar 220 empresas, de incubadoras até grandes multinacionais com foco em energia e meio ambiente além de gerar mais de mil novos postos de trabalho (o que elevaria o número de funcionários empregados nas companhias sediadas na região para cinco mil).
"Estima-se um número de 1.000 PHDs trabalhando nestes centros de pesquisa. Mas não basta isso, o município se aliou ao Estado com um projeto de reforço curricular para toda rede municipal, com matérias diferenciadas como terceiro idioma, para que tenhamos base para que cada vez mais cariocas ingressem na universidade", completa Antônio Carlos Dias.

Fonte: Estadão


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