lições de terremotos que poderiam resolver probleas de enchentes no Brasil

Exclusivo para a revista O Empreiteiro, em parceria
com a Engineering News Record*

Atualizações dos códigos de edificação mostraram-se eficientes quando prédios de construção mais recente resistiram aos abalos sísmicos. O combate às enchentes nas cidades brasileiras pode se inspirar no Chile – implementar um planejamento de longo prazo com obras executadas à risca – ao invés de se limpar apenas as bocas de lobo.

Os terremotos ocorridos em 1960 e 1985 provocaram a reforma dos códigos de obras e das técnicas construtivas no Chile, cujos resultados positivos podem ser constatados no desempenho estrutural das edificações e obras de arte executados no período posterior, que sofreram apenas pequenos danos na sequência recente de sismos que atingiu aquele país. Isso naturalmente ficou em segundo plano com as centenas de vitimas fatais registradas.

O terremoto de 27 de fevereiro atingiu 8.8 na escala Richter – o mais forte ocorrido desde o sismo de 1960, que chegou a 9.5. Mais de 500 mil casas foram seriamente abaladas ou destruídas, envolvendo dois milhões de pessoas. Os sistemas de transportes e comunicações foram interrompidos, restando apenas estações de rádio em funcionamento precário. Um milhão de meio de pessoas ficaram sem energia elétrica.

De acordo com a revista Engineering News Record, o professor de engenharia civil Alfonso Bastias, da Universidade Católica do Chile, em Santiago, afirmou que a maioria dos danos ocorreu em estruturas mais antigas. Edificações mais modernos que entraram em colapso serão objeto de investigações para averiguar se foram construídas de acordo com o código em vigor.

Durante décadas recentes, a indústria da construção chilena reforçou suas práticas e o governo traçou planos de contingência para enfrentar novos sismos. Os códigos de obras do país são considerados ao nível de regiões como a Califórnia, nos EUA, igualmente suscetível a abalos sísmicos. No Chile, edifícios com mais de oito andares possuem um sistema contínuo e reforçado de paredes estruturais que ajuda a amortecer os piores efeitos dos abalos sísmicos.

O país enfrenta uma tarefa extraordinária de reconstrução, que será um desafio inesperado para o presidente eleito Sebastián Piñera. As perdas cobertas por seguro são estimadas em mais de US$ 2 bilhões, com uma perda econômica total superior a US$ 15 bilhões. O aeroporto de Santiago foi fechado, assim como o principal porto chileno em Valparaíso, que sofreu danos. Diversas rodovias de ligação entre as regiões mais atingidas pelos tremores ficaram interrompidas, embora muitas das estruturas danificadas, como a ponte rodoviária sobre o rio Bio-Bio, em Concepcion, que teve colapso quase total, tenham sido construídas antes de as normas antissísmicas entrarem em vigor, aponta Luis Alarcon, presidente da escola de engenharia da Universidade Católica do Chile, em declaração prestada à revista ENR.

A eficácia dos códigos de obras no Chile se contrasta com as dimensões do terremoto ocorrido no Haiti em janeiro passado, fruto da ausência total de normas de construção o país. O tremor de grau 7 teve seu epicentro próximo de uma área densamente povoada, matou mais de 220 mil pessoas e deixou mais de um milhão sem teto.

Embora o tremor recente no Chile tenha sido 500 vezes mais forte que o do Haiti, há diferenças críticas entre as duas situações, segundo Paul Caruso, geofísico da U. S. Geological Survey. A principal diferença, é que o epicentro do tremor no Caribe que foi a 13 km de profundidade, mas precisamente abaixo da capital de Haiti, Porto Príncipe, densamente povoada, enquanto que no Chile foi a 35 km de profundidade e no mar, a 160 km da área urbana mais próxima.

O maior diferencial residiu no grau de preparativos e planos de contingência nesses dois países. O Haiti sofreu o último tremor há mais de dois séculos e meio. No Chile, os abalos sísmicos são freqüentes e muitos ainda se lembram da devastação provocada pelo abalo sísmico de 1960, que atingiu a mesma área, deixou 1.655 mortos e dois milhões de pessoas desabrigadas.

Após esse terremoto, o governo adotou numerosas mudanças nas práticas construtivas e nos códigos de obras. Os padrões do concreto ficaram mais rigorosos, visto que é o principal material usado em obras residenciais. Estas melhorias foram colocadas a prova, em 3 de março de 1985, quando um abalo de grau 7.7 ocoreu na mesma região. Houve 177 mortes e prejuízos materiais de US$ 1 bilhão.

A maioria dos danos ocorreu em edifícios erguidos no período anterior aos novos códigos de obras, como aconteceu com diversas igrejas, edifícios públicos, inclusive a prefeitura de Santiago, esta construída nas décadas de 1950. As obras executadas em alvenaria armada sofreram os piores danos – o que levou a novas provisões no código de edificação.

A despeito da devastação causada pelo terremoto mais recente, o comportamento das edificações mais recentes foi considerado exemplar, graças às continuas melhoras nos códigos de obras em normas antissísmicas, com mudanças substanciais introduzidas em 1993 e 1996. As normas do concreto estão hoje alinhadas com as americanas.

Entretanto, a população mais pobre do Chile continua construindo com adobe – material tradicional que não resiste a tremores de terra. Segundo o governo, a maioria das moradias destruídas em 27 de fevereiro, situadas em regiões rurais, é de estruturas de adobe.

Terremoto x enchentes

Redação da revista O Empreiteiro

A lição que se aprende com o recente terremoto no Chile é que fenômenos naturais são passíveis de serem enfrentados com planejamento de longo prazo e avanços da engenharia. Obras substanciais de drenagem t

erão que ser realizadas nas regiões mais atingidas pelas enchentes no País, a exemplo do mapeamento da rede de drenagem realizado na administração Marta Suplicy em São Paulo, mas que foi ignorado pelo governo que a sucedeu.

As soluções propostas pelo engenheiro José Carlos Vertematti, publicadas na edição de março da revista O Empreiteiro, podem ser colocadas em prática sem demora – inclusive a exigência de que prédios novos tenham reservatórios para águas de chuva.

Piscinões, gostem ou não deles, continuarão sendo necessários. O desassoreamento dos rios, idem. A única coisa que a população não pode admitir é que um administrador público fique de braços cruzados, porque é na estiagem que se prepara a cidade para as próximas enchentes. E quem tiver prejuízo material deve ingressar com ações coletivas reivindicando indenização do poder publico.

Fonte: Estadão

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