Entre tantas obras que fi guram no currículo da Carioca Christiani-Nielsen, uma que é considerada um novo marco, tanto pela sua complexidade técnica quanto pela exigüidade do prazo de execução – que exigiu soluções criativas – é a do Terminal de Gás Natural Liquefeito (GNL), contratada pela Petrobras, na Baía de Guanabara (RJ). Os serviços estão em sua fase final, com conclusão prevista para o mês de novembro. O projeto prevê a construção de uma base de recebimento e regaseificação do GNL adquirido no exterior, para diminuir a dependência do Brasil ao gás boliviano. Essa urgência é que justifi cou a execução das obras em um prazo tão curto: nove meses.
Uma vez concluída, a unidade terá a função de receber o GNL transportado em navios especiais, que serão atracados no píer para o transbordo do gás para um navio cisterna. Como o gás é trazido a uma temperatura inferior a 160º, em forma líquida, para efeito de compressão, o navio cisterna será dotado de equipamentos de alta tecnologia, capazes de transformá-lo novamente à forma gasosa, antes de injetá-lo na rede de gasodutos.
A transferência do produto, do navio supridor para o navio onde é realizada a regaseificação, será feita através de braços criogênicos, instalados no terminal, capazes de suportar temperaturas negativas extremas. Completado o processo de regaseifi cação, o produto, então convertido em Gás Natural Comprimido (GNC), será transferido, por meio de um gasoduto submarino com 10 km de extensão, com continuidade por terra, por mais 5 km, até uma estação de compressão localizada no terminal de Campos Elíseos, na Baixada Fluminense (RJ). O gás processado será usado, prioritariamente, para a geração de energia elétrica nas usinas termelétricas. O excedente entrará no sistema nacional através da rede de dutos. O terminal terá capacidade de regaseificar até 20 milhões de m3 de gás por dia.
A Petrobras é pioneira no mundo na utilização de navios adaptados tanto para o armazenamento do GNL como para a regaseificação do produto a bordo. O primeiro empreendimento com esse formato foi inaugurado recentemente, no porto Pecém, no município de São Gonçalo do Amarante, no Ceará. Atualmente, a Carioca está iniciando um projeto semelhante, para outra unidade de regaseifi cação, em Barra do Riacho (ES). As obras devem começar em dezembro e o tempo de execução será de 11 meses
Logística complexa
O escopo dos serviços contratados pela Petrobras previa inicialmente apenas a construção de um terminal marítimo com plataforma de operação. Isso incluía a construção da plataforma medindo 60 m x 65 m, mais 14 dolfins, – sete de amarração e sete de atracação – além de uma passarela metálica ligando os dolfins à plataforma e uma casa de controle, com quatro pavimentos. Mas o contrato foi ampliado, passando a envolver também a montagem das estruturas eletromecânicas, tubulação de gás, rede de utilidades e de instrumentação, torres de iluminação e sistema de atracação dos navios e de prevenção de incêndio, entre outros, antes a cargo da empresa espanhola Duro Felgueira, que não deu continuidade ao contrato.
As obras civis estão praticamente concluídas. A Carioca Christiani-Nielsen está procedendo a montagem da passarela e a desmontagem das estruturas auxiliares, ao mesmo tempo em que dá início à montagem mecânica dos equipamentos.
As obras no mar, em águas abrigadas da Baía de Guanabara, foram iniciadas em fevereiro deste ano, a uma distância de 6 km do canteiro de obras montado pela empresa, em terra, nas antigas instalações do estaleiro Transnave. No total, foram empregados mais de 13 mil m3 de concreto e 1,4 mil t de estruturas metálicas. Em função do curto prazo de execução, os trabalhos foram tocados em dois turnos, 24 horas por dia, sem interrupção nem nos fins de semana, por cerca de 1.200 operários no pico das obras.
Outra marca desse empreendimento foi a necessidade de mobilização de um grande número equipamentos, alguns construídos especialmente para esse projeto. A impossibilidade de acesso por terra impôs a estruturação de uma logística sofisticada, com a utilização 36 embarcações, simultaneamente. O transporte de guindastes, cábrea, caminhões betoneiras e demais equipamentos, bem como o acesso dos operários e peças pré-moldadas, dependiam exclusivamente de uma frota de balsas, barcos, lanchas e rebocadores.
Entre essas embarcações, destacam-se quatro balsas de grande porte, com 10 metros de boca, que tiveram que ser ampliadas para 17 metros, recebendo reforço de estrutura, de forma a ganhar mais estabilidade e receber oito gruas e guindastes, com capacidades variando entre 100 t e 210 t. Além desses, outros nove
guindastes de grande porte foram utilizados na base de operações em terra.
O principal complicador, na montagem dessa estrutura, foi a falta de equipamentos e máquinas disponíveis no mercado, em um momento em que a indústria da construção civil e toda sua cadeia se encontra fortemente aquecida
O desafio do solo
Outro fator decisivo na definição dos métodos executivos e construtivos adotados foi o perfil geológico do terreno, de baixa resistência sobre substrato rochoso. Para a execução das fundações foram cravadas 266 estacas perfuradas, com até 60 m de cumprimento.
“Nesse método, nós adotamos camisas metálicas com cerca de 80 cm de diâmetro, por onde passamos as perfuratrizes que, atravessando 30 m de lâmina d’água atingiram uma camada de 5 m de rocha, onde foram feitas as perfurações.Inicialmente nós cravamos as camisas com um martelo na camada de rocha fraturada e solo. Depois introduzimos as perfuratrizes nas camisas até a camada de rocha boa, para ser iniciada a perfuração. Concluída a perfuração, nós lavamos a estaca, introduzimos as gaiolas de armação pré-montadas e injetamos o concreto”, detalha a engenheira Luciana Parente, responsável pelo gerenciamento do contrato.
Ela conta ainda que para facilitar o transporte, as gaiolas de armação eram soldadas em seções de 24 m e depois montadas no mar.
Para a sustentação dos dolfins, o projeto previa apenas estacas inclinadas, já que eles receberão cargas laterais muito grandes durante a atracação dos navios. Isso implica em uma complexidade muito grande, para a montagem das estruturas auxiliares e guias de cravação e posicionamento das estacas.
Na execução das fundações foram utilizadas nada menos que sete perfuratrizes operando 24 horas por dia. Luciana lembra que a última vez que foram mobilizadas tantas máquina
s deste tipo, ao mesmo tempo, foi durante a construção da Ponte Rio-Niterói.
“Nós chegamos a ter seis equipes trabalhando simultaneamente, o que exigiu um planejamento muito cuidadoso. A segurança empresarial é uma marca da Carioca. Além disso, essa é uma obra onde nós não podíamos errar. Por isso procuramos nos cercar de todos os cuidados e precauções, desde a estabilidade das embarcações até a segurança dos operários, passando pelas questões ambientais. Se fossemos usar o sistema convencional de atracação das balsas, por exemplo, teríamos um entrelaçamento de cabos muito grande, que impediria as manobras das embarcações. Para podermos trabalhar simultaneamente com todas as balsas, sem que uma interferisse na operação da outra, nós tivemos que desenvolver um sistema especial de amarração, em que os cabos eram embutidos na própria estrutura da balsa”, exemplifica a engenheira.
Ela revela que meses antes do início das obras, foi feita uma projeção do local onde cada balsa estaria, nas várias etapas do processo, de forma a estabelecer o ponto exato dos pontos de ancoragem onde seria feita a sua amarração.No total, foram cerca de cinco meses de planejamento,antes do início das obras.
Todo o concreto utilizado na obra foi embarcado a partir de um canteiro de apoio localizado em uma unidade da Marinha, em terra, a cerca de 1,5 km do local da obra. Nesse canteiro, os caminhões-betoneiras eram abastecidos com o concreto e embarcados em balsas, puxadas por rebocadores, que os levavam até o local do lançamento do concreto.
Esse ponto de apoio foi escolhido por sua proximidade com a obra, o que permitia o transporte do concreto sem risco de sua secagem antes da aplicação.
Várias limitações executivas foram impostas ainda pela interface da Carioca com empresas contratadas para outras etapas do projeto, como, por exemplo, com a GDK, contratada para o lançamento do gasoduto submarino. “Em função dessa interface, em alguns momentos nós tivemos que alterar as seqüências executivas. Quando a GDK trabalhava no lado norte, nós tínhamos que parar os trabalhos naquele lado e concentrar nossas atividades no sul para liberar espaço para eles.”
Experiência é um diferencial
Luciana afirma que a longa experiênciaem projetos portuários, herdada pela Carioca da Christiani-Nielsen, foi fundamental para o sucesso dessa empreitada. Ela cita projetos relevantes nessa área, como o terminal petroleiro da baía da Ilha Grande (RJ); o terminal portuário da Companhia Siderúrgica do Atlântico (CSA), em Sepetiba (RJ); e terminal portuário do Grupo M. Dias Branco, na Bahia.
“A Carioca Christiani-Nielsen é a construtora brasileira com maior número de obras portuárias executadas. Isso certamente nos qualificou muito para esse empreendimento. O que essa obra teve de maior desafio, mesmo, foi o tempo de execução. Esse era um projeto para ser executado em um ano e meio. Realizá-lo em sete meses, como nós fizemos, foi um grande desafio”, informa o engenheiro Álvaro Monerat, diretor do projeto.
Reduzindo impactos socioambientais
Paralelamente a todo o trabalho de engenharia desenvolvido para a construção do terminal de GNL, a Carioca Christiani-Nielsen implementou um programa de responsabilidade sócio-ambiental, vinculado a esse projeto, que deverá servir de parâmetro para os próximos anos.
Para começar, todo novo funcionário, ao ser admitido na empresa, passa por um programa de treinamento em Segurança, Meio Ambiente e Saúde (SMS) de no mínimo 16 horas ou de 24 horas, no caso dos chefes de setores.
Para a obra da plataforma de GNL a Carioca disponibilizou uma lancha de socorro 24 horas por dia, além de uma balsa especialmente dedicada a emergências ambientais, com todos os equipamentos necessários à contenção de óleos e outros resíduos, no caso de vazamento.“Em todas as operações de abastecimento das embarcações, a balsa era mobilizada e ficava ao lado. Imediatamente eram montadas as barreiras como medida preventiva”, afirma a gerente do contrato.
Ela conta ainda que diariamente aconteciam reuniões de avaliação das rotinas de segurança. Ainda durante a execução do projeto, a empresa implantou o Programa Placar, de incentivo às práticas de segurança e proteção ambiental, que passou a avaliar semanalmente e a pontuar as várias equipes atuando na obra, a partir das suas ações voltadas para a segurança e proteção do meio ambiente. Os destaques de cada mês era premiado e cada funcionário, de cada equipe, recebia um determinado número de cupons para concorrer ao sorteio de um carro 0 km. O sorteio aconteceu, finalmente, em setembro, com a premiação de um servente de obra.
A festa de entrega aconteceu com a presença da bateria da Escola de Viradouro.
Outra ação relevante, desenvolvida pela Carioca, foi criar um grupo de relacionamento com os pescadores da região, que temia que o empreendimento prejudicasse a pesca. “A preocupação principal era com relação à instalação do gasoduto submarino, que nem era parte do nosso contrato. Mas como a nossa obra gerou muita movimentação de embarcações, além de restrição à pesca na área em volta da plataforma, decidimos destacar uma equipe para fazer esse acompanhamento junto aos pescadores. Nós procuramos, também, absorver na obra pessoas da comunidade. Muitos foram aproveitados, por exemplo, nas operações das balsas, um trabalho com o qual já estavam familiarizados”, conta Luciana.
Outro programa social de sucesso, e que teve destaque nesse projeto, é o Alfabetizar e Construir. Nele a construtora instala, no canteiro de obras, uma escola para funcionários, oferecendo da alfabetização ao ensino de primeiro grau, com diplomas ao final do curso.
A empresa desenvolve esse programa desde 1991, em convênio com o Serviço Social da Indústria (Sesi), em toda a obra cujo prazo de execução ultrapassa seis meses. Nesse momento, a Carioca Christiani-Nielsen tem cerca de 10 turmas em atividade.
Fonte: Estadão