José Alberto Pereira Ribeiro*
Nos últimos 12 meses ocorreram grandes mudanças na área da infraestrutura de transportes, que saiu da euforia de uma era de grandes investimentos no segundo governo do presidente Lula, graças ao PAC 1, para uma fase de paralisação de obras, gerando problemas de contratação e provocando incerteza sobre o futuro.
Os órgãos de governo, aqui entendidos como executivo e legislativo, e os empresários da construção, precisarão fazer grande esforço de negociação e de entendimentos para construir uma nova realidade e garantir a retomada do crescimento do setor e do País.
Os avanços na infraestrutura – rodovia, ferrovia e aquavia – voltaram à estaca zero e o País passa a ver os seus planos futuros de crescimento adiados por falta de capacidade de escoamento da produção. A China, a Índia, a Coreia do Sul, a Rússia, a África do Sul e outros países emergentes investem hoje mais de 4% do PIB em transportes, enquanto o Brasil, hoje, investe menos de 1%.
Temos problema com relação à queda brutal de investimentos, devido às mudanças na gestão do Dnit e grandes alterações nas formas de contratação de obras públicas. O Congresso acaba de aprovar a extensão da contratação de obras públicas do PAC pelo Regime Diferenciado de Contratações (RDC) e o Dnit está recomendando a todas as suas superintendências a contratação pelo sistema de pregão eletrônico.
Hoje, mais de 60% das obras do PAC no âmbito do Dnit são trabalhos de manutenção. Não consigo ver por que contratar obras de manutenção de rotina pelo sistema RDC, que exige grande urgência, como é o caso da Copa. Na Copa existem acordos internacionais, prazos rigorosos e urgência. No PAC, as obras seguem um plano de cinco anos e tudo tem de ser realizado com planejamento e sem emergenciais especiais.
O pregão eletrônico é ainda mais grave, porque não é adequado para a contratação de obras e não é permitido por lei. Mas os outros órgãos estão esperando por essa inovação. A maioria das pequenas e médias empresas do setor está contra essa proposta. São contrárias também ao sistema RDC, que só atende aos a grandes grupos.
O governo decidiu zerar a arrecadação da Cide-Combustível para neutralizar os aumentos da gasolina. Com isso, acaba com os recursos para investir em infraestrutura de transporte e o setor passa a depender de recursos disponíveis do Tesouro, disputando-os com os segmentos de saúde, educação, assistência social e outros. No ano passado, o governo já havia reduzido a Cide em 40%. Agora, resolveu congelar de vez. Em anos anteriores, chegou a desviar mais de R$ 45 bilhões. Este ano, a arrecadação poderia ser de R$ 10 bilhões/ano. O setor vai perder esse recurso e não sabe se vai receber recursos do Tesouro. Nos primeiros seis meses deste ano, a arrecadação da Cide caiu 42,6% em relação ao mesmo período do ano passado. Agora será zero.
Entre os anos de 2006 e 2011, o País viveu um período importante no que diz respeito a investimentos em infraestrutura de transportes, tendo a Cide como preponderante instrumento de financiamento. Ressalte-se que nos anos de 2008 e 2009, quando vigorou uma redução na Cide para evitar aumentos nos preços dos combustíveis, foram alocados recursos extraordinários do Tesouro e saldos anteriores usando receita da própria Cide. Ressalte-se que, ao longo de seis anos, o governo destinou recursos crescentes e elevados para o setor de infraestrutura usando receitas provenientes da Cide.
Agora, sem a receita da Cide e já tendo esgotado tudo que havia arrecadado no passado e guardado como superávit primário, vamos ter problemas sérios no setor. Esta situação é grave este ano, quando recursos da ordem de R$ 10 bilhões estarão desfalcando a programação de investimentos em infraestrutura. E também vão faltar R$ 2,5 bilhões da Cide para transferir aos estados e municípios para aplicação com a mesma finalidade.
Muitos estados já contrataram obras contando com esses recursos e não vão pagar as construtoras. Poderão dar um gigantesco calote. Naturalmente, o nível de problemas previstos para o setor se repetirá em 2013 e 2014, se for mantida a ausência de cobrança da Cide-Combustível.
Algumas soluções podem ser buscadas, como a redução da meta de superávit primário, para que sobrem imediatamente R$ 10 bilhões para suprir ao longo deste ano a receita da Cide e gerar um recurso adicional para transferir aos estados e municípios.
Com a falta de recursos oriundos da Cide, o Dnit, que já está funcionando lentamente e sem executar os projetos previstos para o ano, pode entrar em colapso total. Os seus diretores e o ministro dos Transportes correm o risco de ficar novamente ajoelhados diante do ministro da Fazenda, implorando por recursos para pagar faturas vencidas das empresas construtoras.
O PAC 2 também será adiado e podemos ter problemas políticos que podem paralisar ainda mais a economia em um momento já difícil, quando o crescimento do País anda por volta de 2% em 12 meses. Os governadores podem não aceitar a medida e cobrar o cumprimento das regras constitucionais sobre a Cide. O dinheiro, na verdade, pertence ao estado e o governo federal o está usando para subsidiar o preço da gasolina sem uma consulta e sem autorização. Um conflito político dessa ordem pode parar ainda mais a economia.
*José Alberto Pereira Ribeiro é presidente da Associação Nacional das Empresas de Obras Rodoviárias (Aneor).
Fonte: Padrão